DE GRÃO EM GRÃO
O texto de Provérbios Pv 7.21-23 nos traz uma descrição precisa do
modo como a mulher adúltera seduz o jovem insensato: “Seduziu-o com as suas muitas palavras, com as
lisonjas dos seus lábios o arrastou. E ele num instante a segue, como o boi que
vai ao matadouro; como o cervo que corre para a rede, até que a flecha lhe
atravesse o coração; como a ave que se apressa para o laço, sem saber que isto
lhe custará a vida”. Este é comparado aos
animais que caminham para a morte sem o saber, atraídos por um bocado de
alimento. A ave, por exemplo, “apressa-se
para o laço, sem saber que isto lhe
custará a vida”, porque só vê o alpiste que está imediatamente à sua
frente. De grão e grão ela se aproxima cegamente do laço e só percebe que está
presa quando já se fechou a porta da arapuca. Esta é igualmente uma descrição
da sedução que vem da nossa própria cobiça, feita por Tiago no texto da nossa
meditação. Ele diz que, como a prostituta sedutora, nossa cobiça nos atrai e
seduz até o pecado: “...cada um é tentado
pela sua própria cobiça, quando esta
o atrai e seduz”. E isto acontece pouco a pouco.
Nós comumente nos enganamos alimentando a carne aos
pouquinhos. Como o glutão inveterado “assalta” a geladeira no meio da noite,
beliscando doces e quitutes, pedacinho por pedacinho, até só restarem farelos
onde antes era um belo bolo de chocolate, vamos cedendo ao nosso coração
pecaminoso, fazendo mimos a nossos apetites carnais. Essa aquiescência sutil é
a mais letal arma do pecado contra nós, pois não exige muito, apenas “um
pouquinho” de alívio para a carne crucificada, o qual culmina no abrir da
jaula, libertando essa fera adormecida à nossa porta (Gn 4.7). Se não pararmos agora, seremos presos e devorados.
Neste processo, procuramos neutralizar a consciência com
diminutivos: “Eu só dei uma olhadinha!”; “foi uma mentirinha que eu ‘tive’ que
contar”; “fiz, mas foi só uma vezinha”. Deixamos negligentemente de perceber a
insuperável influência das coisas pequenas nas grandes reviravoltas da nossa
vida. Não é verdade que o que engorda é “beliscar” guloseimas entre as
refeições? Quem não sabe que o que derruba o alcoólatra é o primeiro gole?
Da mesma sorte, o pecado engana e destrói pouco a pouco.
Sempre no diminutivo, para não percebermos sua malignidade. Nada menos do que a
vigilância incansável e o combate sem tréguas, no poder do Espírito poderá nos
manter de pé. Por isso a advertência:
“Tende cuidado, irmãos, jamais aconteça haver em
qualquer de vós perverso coração de incredulidade que vos afaste do Deus vivo;
pelo contrário, exortai-vos mutuamente cada dia, durante o tempo que se chama
Hoje, a fim de que nenhum de vós seja endurecido pelo engano do pecado”. Hb 3.12-13
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