“E disse-lhes:
Tenho desejado ansiosamente comer convosco esta Páscoa, antes do meu
sofrimento. E, tomando um pão, tendo dado graças, o partiu e lhes deu, dizendo:
Isto é o meu corpo oferecido por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente, depois de
cear, tomou o cálice, dizendo: Este é o cálice da nova aliança no meu sangue
derramado em favor de vós”. (Lc 22:15, 19-20).
Entre
o povo de Israel, a páscoa tem sido celebrada para relembrar a saída de Israel
do Egito, ocasião em que a festa foi instituída (Êx 12). No meio cristão, a
páscoa é a celebração da morte de Cristo, que trouxe libertação dos pecados a
todos os que crêem na palavra da cruz. A libertação de Israel do Egito é um
tipo, uma prefiguração da libertação que Cristo veio trazer por sua morte. De
lá ( do Egito e do Calvário) para cá, em todas as nações cristãs e entre os
judeus, cada um a seu modo, a páscoa é celebrada nestes dias. Ao redor do
mundo, programações, atividades e rituais diversos são realizados com este
objetivo. De lá para cá muita coisa se desvirtuou e o sentido da páscoa tem
sido diluído, até mesmo no meio evangélico. A páscoa que o mundo comemora é a
páscoa do coelhinho e dos ovos de chocolate; é a páscoa do Cristo moribundo,
que morre toda sexta-feira da paixão e ressuscita todo domingo de Páscoa; é a
páscoa dos auto-flagelamentos e do auto-sacrifício, com o objetivo de “identificar-se”
com os sofrimentos de Cristo (Filipinas); a páscoa que o mundo celebra é a
páscoa da abstenção de carne, também como um ato de “respeito” para com a morte
de Cristo, ao contrário do contexto original, no qual os judeus celebravam
comendo um carneiro assado; é a páscoa do “sábado de aleluia”, quando as
pessoas se põem a beber e a farrear sem pensar no verdadeiro sentido da páscoa.
E no meio evangélico – mas não apenas entre nós – é a páscoa das encenações das
atividades evangelísticas e das cantatas que relembram os passos de Jesus
através da crucificação até a ressurreição.
No entanto, precisamos resgatar a perspectiva bíblica da celebração da
páscoa. Os cristãos estão certos quando a ligam à morte redentora de Cristo e à
libertação que ela traz aos que crêem, libertação prefigurada na Velha Aliança.
Mas o que quero questionar aqui é a celebração da páscoa limitada a alguns dias
no ano. Esta não é a genuína celebração da páscoa. Na Nova Aliança só nos são
apresentadas duas maneiras de celebrar a páscoa:
O
texto acima em destaque mostra que, durante a páscoa dos judeus, Jesus
instituiu uma Nova Aliança. Ele partiu o pão e deu o cálice aos discípulos como
memorial de sua morte, estabelecendo um novo rito pascoal, que lembraria sua
morte (Lc 22.15-20). Dessa forma, Jesus se apresenta como o cumprimento da
Páscoa. Assim, a Eucaristia ou Ceia do Senhor é um novo memorial para uma Nova Aliança
(ver Mt 26.26-29). Consequentemente, a
celebração bíblica da Páscoa ocorre todas as vezes em que partimos o pão e
bebemos do cálice, “anunciando a morte do Senhor até que ele venha” (1Co
11.27).
Além disso, o Novo Testamento nos mostra em
outra passagem que a celebração bíblica
da Páscoa se realiza através de uma
vida santa. Repreendendo aos coríntios por permitirem a imoralidade no seio
da igreja, o apóstolo Paulo usa a figura da páscoa para exortá-los a tratar do
pecado, até mesmo excluindo o pecador impenitente. Ele diz: “Não é boa a vossa
jactância. Não sabeis que um pouco de fermento leveda a massa toda? Lançai fora
o velho fermento, para que sejais nova massa, como sois, de fato, sem fermento.
Pois também Cristo, nosso Cordeiro
pascal, foi imolado. Por isso, celebremos a festa não com o velho fermento,
nem com o fermento da maldade e da malícia, e sim com os asmos da sinceridade e
da verdade”. O que ele quer dizer é
que a morte de Cristo, nossa páscoa (tradução literal), faz de nós, seu povo,
nova massa, sem o fermento do pecado. Esta é uma alusão aos pães asmos usados
na celebração pascal da Velha Aliança. A igreja é o povo santo de Deus e deve
celebrar uma vida santa porque Cristo já morreu pelos nossos pecados. Deve
evitar que o velho fermento do pecado volte a perturbar. Desse modo a
celebração cristã da páscoa se dá através de uma vida santa e pura. A
celebração da morte de Cristo na Ceia do Senhor e a vivência de uma vida pura e
santa, que é fruto da morte redentora de Cristo, são a verdadeira expressão da
Páscoa.